Numa época não muito distante, há duas ou três décadas atrás, um garoto que desejasse adquirir um novo par de tênis para ir à escola ou mesmo praticar um esporte não possuía muitas opções – havia de contentar-se em escolher entre o conga (nas cores azul e vermelha), o polivalente kichute – usado tanto para frequentar as aulas como para jogar futebol, muitas vezes com cadarço amarrado na canela ou o seu sucessor, o bamba monobloco branco, também utilizado para ir à escola, as aulas de ginástica e praticar esportes.
Atualmente, o processo de escolha de um novo par de tênis é bem mais complexo. Atreva-se a um breve tour pelas lojas de calçados do shopping center – geralmente há uma grande profusão delas. São tantos modelos, cores, formatos, marcas, aplicações, faixas de preços e sistemas de amortecimento que uma confusão imediata se aloja em nossa mente. Qual comprar?
Fato similar ocorreu com o pão de forma. Anteriormente havia somente o pão Pullman, que por muito tempo, reinou solitário. Hoje a quantidade de fabricantes é enorme – pesquisa feita pelo Inmetro cita 74 fabricantes. Os mais tradicionais são Pullman, Wickbold, Panco e Seven Boys. Cada fabricante oferece ao mercado consumidor uma variedade de produtos maior ainda (light, integral, de centeio, pão preto, com aveia, musli, 7 grãos, 2 grãos, com casca, sem casca, e demais variações).
A situação é análoga para os demais produtos oferecidos aos clientes e consumidores. É fato que a variedade tem crescido exponencialmente. A idéia central é reconhecer cada consumidor como um ser único, com necessidades e desejos distintos. Customização dos produtos e serviços é palavra-chave para obter preferência do cliente.
A máxima de Henry Ford “desde que seja Ford e seja preto”, dominante no início do século XX, não é mais válida. A produção em massa baseada em altos volumes e baixa variedade é gradualmente substituída por novos paradigmas de produção – manufatura enxuta, manufatura ágil, manufatura responsiva.
Somente custo não é mais suficiente. Somente custo e qualidade já não bastam. Novos critérios surgem. O mercado requer flexibilidade, pontualidade e velocidade. Além disso, o mercado não pede, manda. Manda porque a partir da década de 80 é regido pela demanda, uma vez que há muito mais oferta do que procura, acirrando a competição entre os fabricantes e fornecedores.
Este novo cenário exige um novo posicionamento das empresas. Muda-se paulatinamente a estratégia de resposta à demanda. Respeitando a peculiaridades de alguns segmentos produtivos, mas de modo geral, a estratégia de fazer para estoque (Make-to-Stock) e a partir de então atender o cliente, perde força. Como a variedade de produtos finais é elevada não é viável e exequível ter todos os produtos em estoque. A estratégia de fazer para pedido, nas suas múltiplas variantes avança (montar para pedido – ATO, fabricar para pedido – MTO, projetar para pedido – ETO, entre outras).
Esse novo ambiente requer fornecimento personalizado, lotes de fabricação reduzidos, baixo nível de estoque (matéria-prima, work-in-process e produto acabado), redução dos lead times, rapidez no atendimento, cumprimento de prazos prometidos e setups mínimos.
Essas novas exigências aumentam consideravelmente a complexidade das atividades de Planejamento e Controle da Produção (PCP), notadamente da Programação da Produção, ressaltando ao mesmo tempo sua importância para competitividade das organizações.
Voltemos ao caso dos calçados, mais especificamente do tênis. Anteriormente, definir a fabricação de 3, 4 ou 5 modelos de tênis distintos, produzidos para estoque, um bom PCP utilizaria conceitos e técnicas de previsão de vendas, planejamento agregado e plano mestre para obter planos de produção adequados.
Atualmente, produzir milhares de tênis distintos, para atender uma enormidade de pedidos de vendas, oriundos de clientes diferentes, com prazos de entrega variados e com muitos itens em cada pedido, mas com uma quantidade pequena de cada item é necessário acrescentar uma nova arma ao arsenal do PCP: a programação da produção.
Cabe à programação da produção resgatar o plano mestre de produção e a carteira de pedidos, estruturados de forma agregada e numa unidade de planejamento maior, e gerar um programa de produção detalhado, em base diária, considerando todas as operações e seus respectivos recursos fabris (máquinas, mão-de-obra, dispositivos, ferramentas) para transformar matéria-prima em componentes, e componentes em produto acabado.
A programação da produção lida com uma elevada quantidade de variáveis, múltiplas alternativas de programas resultantes e acelerada dinâmica do chão-de-fábrica, com pedidos sendo introduzidos, cancelados, postergados ou antecipados; máquinas operatrizes entrando em manutenção corretiva; atraso de insumos de fornecedores; absenteísmo de operários, entre outros fatores, que colaboram por torná-la uma atividade extremamente complexa.
Complexa mas que precisa ser feita, e feita com critérios.
Na realidade, quem ativa os recursos fabris existentes no chão-de-fábrica, local onde concentram-se a maior parte dos ativos das empresas de manufatura, é a programação da produção. Ao direcionar, de forma coordenada e sequenciada no tempo, os recursos fabris para realização das operações atinge-se os objetivos de atendimento dos prazos de entrega, diminuição dos estoques e melhor utilização dos recursos.
Agora é a hora. Agora é a vez. Invista seus esforços e energia na programação da produção. Um melhor desempenho dessa atividade, crucial no cenário competitivo atual, fará com que seus recursos sejam melhor geridos, proporcionando melhores resultados tanto na diminuição dos custos (horas-extras, inventários, multas por atraso), quanto no aumento do faturamento, fruto de maior pontualidade nas entregas e maior satisfação do cliente.
Josadak Marçola